Olho pra cima e pergunto se é sério, Deus

Isso só pode ser brincadeira

Carla Leonardi
rascunhando

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Sabe quando você vai pegar uma blusinha pendurada no armário e, ao tirar o cabide, a alça de uma se enrosca no cabide de outra? Mas em vez de usar as duas mãos pra desenganchar, você continua puxando na força da raiva, até que a outra cai com cabide e tudo no chão do guarda-roupa?

É a mesma sensação de tentar pegar alguma coisa na geladeira que está lá no fundo da prateleira e, com preguiça de tirar todo o resto da frente, você vai torcendo o braço e desviando dos outros potes até derrubar um ou vários deles, maldizendo o mundo.

Igual quando você está manobrando o carro e sem querer aciona os limpadores do para-brisa — ou, pior, o limpador do vidro de trás, que eu nunca sei como desligar e fico mandando a manivela pra cima, pra baixo, pra trás e pra frente em diferentes sequências até ele parar, sem que eu entenda qual foi o movimento certo.

Tipo quando a toalha de rosto cai ao lado da pia e leva com ela a caixa de grampos que estava no cantinho da bancada. Ou quando você pega um cabo de carregamento na gaveta e todos os outros vêm junto.

Uma sensação parecida com aquela de quando você se deita para assistir TV e os mesmos travesseiros ou almofadas de todos os dias simplesmente não se moldam mais à sua cabeça, e ao menos 40 minutos iniciais do filme são tentando ajeitá-los.

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A minha vida tem sido feita disso. Uma sequência de pequenas irritações diárias compondo uma tristeza maior. Mas outro dia foi campeão. Senti uma coisinha no cabelo e pensei que fosse uma mecha dançando com o vento do ventilador. Passei a mão por cima da orelha direita e era uma abelha. Ela picou meu dedo, num golpe final, antes de cair agonizando no chão e rindo da minha cara. Olhei pra cima e perguntei se era sério, Deus. Só pode ser brincadeira.

Lembro de uma situação na minha vida, quando estudei fora, e respiro fundo. Vivi por um tempo uma sequência de eventos chatos, muito chatos, e de coisas dando errado uma atrás da outra. Eu só reclamava (com razão) e dizia que nunca deveria ter saído da minha cidade no Brasil. Até que, bom, num exercício otimista, lembro de alguém dizendo que é preciso mudar as vibrações. Pensar em coisas boas pra atrair coisas boas. Consegui fazer lá e deu certo. Penso que preciso tentar de novo. Não acho balela, acredito — o difícil é fazer.

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Carla Leonardi
rascunhando

Jornalista e leitora inveterada. Conversando sobre livros no Instagram @ca.leonardi